sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Entretanto

O meu dedo carrega no botão que chama o elevador e eu não tenho medo. Ando à minha procura e este é apenas mais um lugar. Quando me sento, do outro lado da janela está uma praça inteira e, nela, eu estou partida. Os meus braços, as minhas mãos pernas pés os meus olhos o meu coração está em toda a parte dessa praça e, enquanto falo com ele, que não conheço, a praça entra-me pelo peito e quase me impede de continuar. Falo muito. Até que lhe digo.
- "Se calhar, sou louca".
Ele quase que ri. Mas não ri. Tenta explicar-me que posso caminhar sem que o meu corpo seja gelatina. Eu componho frases com nexo e conto-lhe coisas feias e outras menos feias mas o que eu lhe quero dizer aquilo que lhe quero pedir não tem voz
- Eu queria esquecer, se faz favor.
Mas não digo.
Há outras coisas que gostaria de pedir. Enquanto lá estou, respondo a tudo, enquanto a praça me arranca bocados da alma, me grita infortúnio, me chama de má sorte.
Há coisas a compor. Ele diz-me coisas que eu sei. Mas estou partida há tanto tempo.
Antes de me ir embora, ele faz-me a pergunta mais difícil. Estou de pé, mala na mão e ele atira-me a pergunta e esta é toda a praça a entrar-me pelos olhos dentro. A pergunta é a minha dor.
Respondo
-Não sei.

Tenho de lá voltar. Mas continuo sem saber o que responder.

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