quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

todos os medos

No mês de todos os medos choveu sempre. Em mim, a tempestade. À noite, as canções de embalar eram como riscos num vidro perfeito. Queria ter muitas palavras e não tinha muitas palavras. Li tanto e baralhei o destino. No mês de todos os medos. A comida esteve sempre salgada ou falhei a salsa. Choveu sempre, mesmo quando parecia que ia fazer sol. Atravessei a chuva e a cidade. Não sei como fiquei.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Nada

Cuida de ti cuidamos falta-nos muito olha bem e cuida de ti cuidamos as janelas já não abrem a rua é triste os cafés amargos a noite imensa e nós pequenos tão pequenos pequeninos. Cuida de ti cuida de ti cuida de ti. O chão tem migalhas a cortina é a mesma e o resto nada.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Ouve

Capitão, capitão, não tenho medo de morrer, desde que me tragas os olhos ciganos do meu primeiro amor e a primeira vez que senti um filho. Leva-me ao colo do meu pai e devolve-me uma tardinha morna em que esperava pela minha mãe. O dia em que ela chegou. Capitão, eu não tenho medo de morrer, desde que me tragas o muro onde escrevi datas de esperança e o blusão preto que me fez feliz a cabine telefónica a camisa de dormir verde com flores e o primeiro dia de tudo. Capitão, que o último seja outra vez o primeiro. E eu vou.

Tatuagem

Aquele exacto sítio, o café o barulho o vestido pendurado eu a gostar de vestidos a esperança lembras-te? Lembro-me. Na rua, os semáforos ficavam sempre verdes e continuava a ser tudo difícil. Mas. Um coração tão cheio continuar depois do vidro partido acreditar acreditar. Cantávamos. Gente e mais gente. O vinho era barato e então? E então. Bonito como deixou de ser. A calçada as coisas a resolver tudo se resolvia até apanhei um avião. Fui eu quem mudou. Apenas eu.

Laura

You say, that they’ve all left you behind Your heart broke when the party died Drape your arms around me and softly say Can we dance upon the tables again? When your smile is so wide and your heels are so high You can’t cry, put your glad rags on And let’s sing along To that lonely song you’re the train that crashed my heart You’re the glitter in the dark Uh, Laura you’re more than a superstar And in this horror show I’ve got to tell you so Uh Laura you’re more than a superstar You say that you’re stuck in a pale blue dream And your tears feel hot on my bed sheets Drape your arms around me and softly say Can we dance upon the tables again? When your smile is so wide and your heels are so high You can’t cry put your glad rags on and let’s sing along. To that lonely song You’re the train that crashed my heart You’re the glitter in the dark Uh, Laura you’re more than a superstar You’ll be famous for longer then them Your name is tattooed on every boy’s skin Uh, Laura you’re more than a superstar you’re the train that crashed my heart You’re the glitter in the dark Uh, Laura you’re more than a suṗerstar And in this old horror show I’ve got to let you know Uh Laura you’re more than a superstar

domingo, 19 de janeiro de 2014

Domingo

Quando eu ando as minhas pernas têm muitos anos em todas as esquinas a desilusão. O miúdo olha as estrelas e pedimos os dois coisas impossíveis IMPOSSÍVEIS não doer tanto, ser tudo quando tudo podia ser ou então não saber de nada. "Aguenta", diz a criança. Com as pernas como mundos ingratos os olhos como rios de lodo as nódoas negras nas estradas e no meu sofá. Queria entender a razão de ser das coisas porque uns assim são e outros não, é como não entender a morte de inocentes. Ontem hoje ontem amanhã sempre uma tatuagem eterna. A comida desce como se não entendesse também ainda assim lavei a loiça e isso sabem lá é uma vitória do outro lado não sei. Deste lado, na minha rua, a minha ingenuidade é uma bandeira rasgada é por isso que pintei o cabelo de negro. Lembra-me de quando eu acreditava em cabelo negro em coisas bonitas quando o mundo parecia quase perfeito e eu nele tinha um lugar. Desculpem pessoas, como tu, doce M., que já me levaste ao colo nesta história, nas minhas palavras nas minhas ausências. Sabem lá, eu não sei dizer, não quero contar para não ser apenas mais uma história. Esta é a minha história. Feia e vulgar bela e gigante como todas as de palácio e as de casebre. Mas eu não fiz batota. Eu nunca fiz batota. Foi por isso que perdi?

Demasiado

Eu tinha um sonho. Era um sonho bonito. Foi muito estúpido durante demasiado tempo. Demasiado. Esta palavra em tudo. Demasiado tempo, demasiado bom, demasiado mau, demasiado torto, demasiado impossível. Virei-me ao contrário demasiado e demasiadas vezes. Era um sonho e comandou a minha vida como o homem canta. Tirou-me tudo este sonho demasiadas coisas durante demasiado tempo demasiada crença demasiada dor demasiados dias maus demasiada esperança demasiadas lágrimas demasiado contra mim. Este sonho era bonito. A vida é feia. Os actos das pessoas são feios. Só o sonho é bonito. Demasiado bonito.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

MUTE

a música.

Para sempre

Nada de três dias. Uma eternidade.

Espantalho

Foda-se, não tenho mais desculpas. Passou muito tempo. As que usava ficaram gastas espantadas a olhar para mim a rirem delas próprias. Tenho medo de ser um espantalho carregado de pássaros. Não há mais desculpas. Como nos defendo agora? O que era há tanto, tanto tempo, continua a ser. Até o que parecia não mais voltar, voltou, neste momento, como se nada tivesse acontecido. Como te vou desculpar? Como me vou desculpar? O que foi tudo isto, afinal?

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Agora

Respiro. Respira. Respiro. Respira. Respiro. Quando eu partir para a guerra levo os olhos do meu filho. O meu coração. A lealdade. Os meus demónios. Se perder, os olhos do meu filho, o meu coração, a lealdade, sobreviverão aos meus demónios. E tu?

Afasta de mim esse cálice

Abria a garrafa de vinho. Era fácil. (Eu também podia abrir uma garrafa de vinho). É sempre fácil quando não há nada a perder. As minhas respostas não estão do outro lado da garrafa de vinho. Nem as tuas. Precisas assim tanto que alguém te diga que estás a fazer tudo bem? Estás a fazer tudo bem, pronto, já disse. Já passou? Não, pois não? Eu que já perdi (quase) tudo, sei. Abrimos uma garrafa de vinho, dizemos coisas bonitas, é tudo tão leve e idiota. Dentro de nós um vulcão por extinguir e, do outro lado, alguém que acredita que não existe lava que não existe medo que não existe (já) outra pessoa. Depois, alguém se ri das nossas piadas, passa a mãos nas nossas feridas, ainda devagar. Conta-nos coisas e é outra vida e por momentos (breves) acreditamos que pode ser que podemos abrir garrafas de vinho e sermos outros. Sim, eu podia abrir uma garrafa de vinho. Imagina isto: convidava os gritos que te gritei e a incompreensão de que me acusas. Bebíamos uma garrafa de vinho. Brindávamos até. Também se desonra uma história durante uma garrafa de vinho.

sábado, 11 de janeiro de 2014

O medo

O medo é uma cabra e uma puta. O medo faz-nos ser pequeninos e ousar nada. Normalmente são os mais medrosos que dizem de boca cheia que não têm medo de nada. Como eu. Se eu não tivesse medo não era tão egoísta e minúscula. Tem de chegar o dia em que olhamos para dentro de nós e nos permitimos deixar de foder a vida dos outros só porque somos uns bebés chorões cheios de certezas ridículas que sugam a bondade dos que têm mais que fazer. O medo é uma cabra e uma puta. E nós às vezes temos mesmo é de levar com um camião na tromba. Sem chorar.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Às vezes não

"O que escolhes é entregar-me o podre e o que nos minou numa bandeja de insensibilidade, como se escrevesses num muro a letras gordas más e infames tudo o que sempre nos afastou."