quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Não podes ficar

Pai, estás tão magro. Não te dão comida no céu? É o segundo dia que me visitas e, como sempre, eu sei que não pode ser verdade. É bom e triste e somos nós às vezes sem sermos nós. São sonhos sem serem sonhos, porque neles não há o dom da maravilha do sonhar. És tu, do outro lado de mim. És tu, triste como eu. Mas és tu comigo e isso é um milagre. Falámos. Disseste coisas. Eu disse coisas. Até que pousei a cabeça no teu colo e quase adormeci dentro do sonho. E disse-te: "Não posso ficar aqui muito tempo, porque me sabe bem e depois não acordo". E tu foste um sorriso imenso mas todo aquela tristeza doce de já não poderes estar aqui, de sabermos disso, ambos, de eu ter de caminhar sozinha, sem te olhar. Aqui no meu sonho no meu desejo na minha cabeça, tu conduzias o carro. As saudades dos teus braços morenos, esticados, equanto conduzes. Mas, Pai, estás tão magro. Sempre foste assim tão magro? Come, não te entristeças, não morras ainda mais nessa morte longe de mim. E volta, sim? Fica aqui este bocadinho. Fazes-me falta (e sim, eu sei que me abraçaste, é por isso que sei o magro que estás).

2 comentários:

  1. A minha mãe nunca me visitou, nestes últimos 20 anos. Provavelmente consigo-lhe disfarçar bem a falta que me faz. Sou boa na arte do disfarçar.
    Beijinho*

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