sexta-feira, 22 de junho de 2012

Necessidade

Senhor Doutor, dói-me a tristeza. Não é dor de corno nem saudade. Não, não ando deprimida ou ansiosa. É outra coisa. Doutor, veja lá, encontre um nome para este lugar aqui. Mais ou menos entre o coração e o estômago, mas assim de lado, com reflexos no coração e no estômago, mas não são esses que doem mais. Dói-me o lugar da tristeza. Não é um órgão; tem a certeza? Pois, mas é exactamente aí que me dói. Os sintomas são: dificuldade em respirar fundo, sonhos confusos e longos e perda de memória decente. Só me lembro de coisas que não servem para nada. Queria ter uma dor de garganta, de cabeça, ter partido o pé, deslocado a clavícula. São coisas que as pessoas entendem. Para isto, existem senhas cor-de-rosa e médicos à nossa espera. Podemos dizer aos amigos: não ando muito bem, parti o pé. Se lhes digo que me dói a tristeza, convidam-me para ver filmes, oferecem-me cerveja, falam-me de um novo parque para ir com o miúdo. Eu vejo, eu bebo, eu vou. Enquanto a dor continua. E calo-me. Senhor Doutor, não lhe peço a cura, mas um analgésico. Três ou quatro horas de descanso, ou então oito, ainda melhor. E um nome para este lugar onde me dói tanto.

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