Da primeira vez é como um ataque. Reagimos após o choque. Atiramos com tudo: pedras, tempestades, valentias, jogo sujo, que não há maneira de dizer branco no meio do carvão. É um escuro sítio de finos galhos espetados no coração. Depois de os partirmos, ficam sementes de madeira cá por dentro. São elas que nos apodrecem. Que te apodrecem. Da segunda vez sentamo-nos numa cadeira e ficamos a pensar. Leva dois minutos. Aparecem então os troncos e arrombamos portas, convocamos amigos, existem lágrimas mas são curtas e sem sabor algum. Em desassossego quebramos janelas e explodimos com ruas. E apesar disto, do Carnaval que montamos, é tudo essa farsa. Acreditamos. E, da terceira vez, entre os gritos roucos existem bocados de carne morna e nauseabunda, olhamos em frente e aquele rosto é irreconhecível. E o que sentimos é irreconhecível. Este é o tempo de todas as convulsões. Como um vulcão vomitamos a incredulidade e o terror de ainda ser tudo verdade. Vencidos pelo medo, as palavras continuam duras e cortantes mas se prestares atenção há todo um velório em fundo, onde entram pessoas que falam baixinho e as velhas carpideiras são as vozes a fazer eco dentro do nosso coração. Irão continuar por muito tempo a fazer-se ouvir e apesar de tudo o que vier depois, há ali uma parte que nunca se resgata. Das outras vezes, choramos apenas. Dormimos. Se houver sol vamos à rua e, como zombies, deixamos cair chaves de casa, entornamos o café, não atendemos telefones e adiamos coisas tão importantes como a vida.
Da última vez, não existe um único som. Não restou nada para partir, carpir, fazer sumir, acreditar, vangloriar, entontecer, chantagear, derrubar, contrariar, virar à esquerda será o mesmo que virar à direita. Uma ou duas lágrimas por precaução, só para ter a certeza.
Da última vez estamos imunes. E é quando estamos imunes à dor que sabemos que estamos igualmente imunes ao amor.
É um longo caminho que acaba à saída do supermercado ou enquanto estrelamos um ovo.
Sem comentários:
Enviar um comentário