Antes paravas lá no sítio onde eu te dizia as coisas que não te podia falar. Lias-me. Tentavas perceber. Voltavas atrás na frase e tentavas descobrir-me.
Hoje pensas que já sabes tudo de mim. E, se calhar, sabes. Mas, aviso-te, e este aviso não é uma seta, não te assustes, aconselho-te, ou melhor, conto-te, que existem sempre coisas que não sabemos.
Habituaste-te a esta superfície de mim e a culpa também foi minha. Às tantas, foi exclusivamente minha.
Caminho ao teu lado e há sempre uma rua a separar-me de ti. Enquanto aparas o bigode e arranjas a barba, eu sei coisas que não te digo e dentro de mim continuo a ser eu, sem que tu saibas.
O teu amor, que é uma coisa física mas tão profunda quanto uma raiz. O teu amor que é como uma moldura que eu olho. E tu passas. Fazes os teus trabalhos. Sentas-te a mesas de cafés. Falas com pessoas que eu não conheço, que não me conhecem, que nunca me apresentaste. Não faço questão. Já não faço questão.
Esta é a minha superfície. Não tenho vagar nem oportunidade, de momento, para ser outra coisa.
Mas lembro-me.
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